Fiança vale até às chaves

Sempre que ocorrer hipótese de prorrogação legal da locação, tenha ou não o locador movido ação de despejo para desalijar o inquilino, a fiança prestada continuará hígida até que o imóvel seja devolvido ao locador.

Prosseguindo na análise pontual da Lei 12.112/09, que alterou a Lei de Locações Urbanas (8.245/91), vejamos o aspecto que mais polêmica suscitou e que maior descrença trouxe à Justiça de parte de proprietários e administradores, por acreditarem que “lei é lei” e que não poderia ser simplesmente derrogada por decisão judicial. Referimo-nos ao artigo 39 da Lei de Locações.

Dizia a lei em redação original: “Art. 39. Salvo disposição contratual em contrário, qualquer das garantias da locação se estende até a efetiva devolução do imóvel.” Mais não precisava dizer e era de uma clareza e simplicidade exemplar, como devem ser os bons textos legais. No entanto, mesmo os textos mais claros ficam sujeitos a interpretação, submetem-se ao raciocínio do julgador. Foi o que aconteceu. A partir de determinado momento, começaram a surgir sentenças que simplesmente ignoravam o comando legal de que “qualquer das garantias da locação se estende até a efetiva devolução do imóvel” sempre que o contrato se encontrasse vigendo por prazo indeterminado ou que o prazo contratual já estivesse vencido.

Pela nova redação, atualizada pela Lei 12.112/09, é nítida a preocupação em fazer valer a vontade do legislador mesmo nas situações em que a locação se prorrogou em função da permanência do locatário no imóvel além do tempo regular fixado no contrato, como se verá. Ficou as- sim assentado:

“Art. 39. Salvo disposição contratual em contrário, qual- quer das garantias da locação se estende até a efetiva devolução do imóvel, ainda que prorrogada a locação por prazo indeterminado, por força desta lei.”

Antinomia

O novo texto, em tese, acaba com a antinomia – nunca compreendida por proprietários de imóveis – entre o que dizia a lei e as decisões contrárias de juízes e tribunais. Por- que, de um lado, a lei impunha a prorrogação automática e obrigatória da locação, findo o prazo inicial estipulado (art. 46, § 1º, ou art. 47), e, de outro, não se aceitava que a fiança ficasse também prorrogada pelo mesmo período (indeterminado) até a devolução das chaves. Das duas uma, pensavam os infelizes locadores: ou o inquilino desocupa o imóvel ou a fiança é válida enquanto nele permanecer por força de lei.

Determina a Lei de Locações que, nas locações ajusta- das por escrito e por prazo igual ou superior a trinta meses, “findo o prazo ajustado, se o locatário continuar na posse

do imóvel alugado (…) presumir-se-á prorrogada a locação por prazo indeterminado, mantidas as demais cláusulas e condições do contrato” (art. 46, § 1º), e que, nas locações pactuadas por prazo inferior a trinta meses, “findo o prazo estabelecido, a locação prorroga-se automaticamente por prazo indeterminado” (art. 47, caput).

Agora, repita-se, sempre que ocorrer hipótese de prorrogação legal da locação, tenha ou não o locador movido ação de despejo para desalijar o inquilino, a fiança prestada continuará hígida até que o imóvel seja devolvido ao loca- dor. A lei deixou explícito o que estava bem definido em regra geral, fechando uma porta de escape para o intérprete e operadores do direito.

Contudo, dada a força relativa do legislador, não será surpresa se, em algum dia do futuro, outro vier a ser o entendimento de juízes e magistrados, que realmente são quem diz o que é a lei.

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