Em 12/05/2021 foi publicada a Lei nº 14.151 que determinou o afastamento da empregada gestante das atividades laborais na modalidade presencial, durante pandemia da covid-19. O art. 1º da referida norma previa que “durante a emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do novo coronavírus, a empregada gestante deverá permanecer afastada das atividades de trabalho presencial, sem prejuízo de sua remuneração”. E o parágrafo único complementa com a seguinte determinação: “a empregada afastada nos termos do caput deste artigo ficará à disposição para exercer as atividades em seu domicílio, por meio de teletrabalho, trabalho remoto ou outra forma de trabalho a distância”.
Desde a sua edição, a norma foi muito criticada, especialmente porque não previa a possibilidade de afastamento previdenciário nas hipóteses em que o teletrabalho fosse incompatível com a função desempenhada na empresa, como ocorre, por exemplo, com a empregada motorista, empregada doméstica, dentre outras funções. Nestas hipóteses, o empregador tinha o dever de manter o pagamento do salário sem receber qualquer contraprestação da empregada.
Em 10/03/2022, foi publicada a Lei nº 14.311, que alterou o artigo 1º da Lei nº 14.151/2021, para prever que durante a emergência decorrente da covid-19 deverá haver o afastamento da atividade presencial da empregada gestante que ainda não tenha sido totalmente imunizada contra o agente infeccioso, de acordo com os critérios definidos pelo Ministério da Saúde.
Assim, segundo a nova regra, caberá ao empregador optar em manter as gestantes em teletrabalho, ainda que já vacinadas, ou determinar seu retorno à atividade presencial, desde que cumpridas uma das seguintes hipóteses: encerrado o estado de emergência decorrente do coronavírus; após a gestante ter completado o ciclo de imunização; ou “mediante o exercício de legítima opção individual pela não vacinação contra o coronavírus SARS-CoV-2 que lhe tiver sido disponibilizada, conforme o calendário divulgado pela autoridade de saúde e mediante o termo de responsabilidade de que trata o § 6º deste artigo” (art.1º, §3º, III).
Não há dúvida de que esta alteração atenuou os prejuízos que a norma anterior trouxe quando determinava, sem qualquer exceção, que todas as empregadas gestantes fossem afastadas das atividades presenciais indiscriminadamente. Contudo, ainda permanece na lei uma espécie de licença remunerada em favor das gestantes, nos casos em que não for compatível o desenvolvimento das atividades via teletrabalho, a gestante receberá sua remuneração integral sem qualquer prejuízo ou afastamento previdenciário.
Inicialmente, o projeto de lei aprovado pelo Congresso, previa que na hipótese em que a natureza do trabalho da gestante fosse incompatível com o teletrabalho, a empregada teria sua condição considerada como de risco até completar a imunização e receberia, em substituição à remuneração, salário maternidade desde o afastamento até 120 após o parto. Contudo, esta regra foi objeto de veto pela presidência.
Dentre as razões do veto, esta que ao se dilatar o prazo de fruição do salário maternidade pago pelo INSS restaria apresentado alto potencial de alteração de despesa obrigatória relacionada à concessão de benefícios previdenciários, colocando em risco a sustentabilidade do Regime Geral de Previdência Social.
Não há dúvida que a nova regra atenua as imposições da norma anterior, especialmente porque permite que as funcionárias vacinadas desempenhem suas atividades de modo presencial. Contudo, ao deixar de prever o benefício previdenciário nas hipóteses em que não seja possível a imunização e o teletrabalho seja incompatível com a função desempenhada pela empregada cria, mais uma obrigação financeira ao empregador, que como consequência pode gerar fator de discriminação no momento da contratação de mulheres.
Mais uma vez o legislador optou por não deferir o benefício previdenciário às gestantes, imputando o ônus ao empregador. Entretanto, tal circunstância tem sido amplamente debatida no Poder Judiciário, especialmente com fundamento no artigo 4º, §8º, da Convenção nº 103 da Organização Internacional do Trabalho Relativa ao Amparo à Maternidade, recepcionada pelo ordenamento jurídico brasileiro por meio do Decreto nº 10.088/2019, o qual prevê que “em hipótese alguma, deve o empregador ser tido como pessoalmente responsável pelo custo das prestações devidas às mulheres que ele emprega”. Com base nesta norma, em vários processos judiciais foi determinado que o INSS implantasse o benefício de salário maternidade à gestante, cuja atividade fosse incompatível com o teletrabalho. (Processo nº 5003320-62.2021.4.03.6128 e nº Processo nº 5028306-07.2021.4.04.0000).
Por Gisele Bolonhez Kucek, mestre em Direito pelo UNICURITIBA. Especialista em Direito Processual Civil. Bacharel em Direito pela UFPR. Advogada sócia da Derenne e Bolonhez Advogados Associados.