Convenção tem poder real

Havendo conflito de normas entre convenção registrada e regimento interno não registrado, prevalece o que diz aquela.

“A convenção condominial é o instrumento que constitui a com propriedade; o regulamento interno disciplina a vida social e não o direito real que o título constitutivo outorga, o que conduz à certeza de que no confronto entre dispositivos conflitantes entre as duas normas, acerca do uso de garagem, vale o que consta da convenção registrada no Cartório de Registro (art. 9o, § 1o, da Lei 4.591/64).”

Embora se refira à Lei do Condomínio e não ao Código Civil de 2002, em função da época em que os fatos ocorreram, a decisão acima (Ap. Cível n.281.184-4/0-00), da Terceira Câmara Cível do Tribunal de Justiça de São Paulo, enfrentou problema intrincado que afligia condomínio da capital paulista.

Informa o relator, desembargador Ênio Santarelli Zuliani, que o condomínio apelou de decisão de 1o grau que beneficiou morador e proprietário de apartamento, a quem foi reconhecido o direito de usar, em conjunto com outros dois condôminos, uma das vagas que remanesceram sem titularidade, no prédio, quando de sua construção, conforme consta do documento de instituição do condomínio. Alegou o síndico, na apelação, que posteriormente ao fato houve assembleia de condôminos a qual destinou tais vagas aos condôminos que adquiriram as maiores frações ideais.

Em seu voto, o relator sustenta que não há na convenção qualquer cláusula ou regra comum de negócio jurídico dispondo que as vagas de garagem em questão seriam destinadas a apartamentos com frações ideais superiores.

Contudo, o regimento interno modificou o sentido de exclusividade de uso dos blocos, permitindo que proprietários e moradores de outras partes da edificação passassem a fazer uso das garagens do bloco onde reside o autor, afetando seu direito de uso partilhado da vaga.

De acordo com a convenção – prossegue o relator –, duas vagas de estacionamento permaneceram sem titularidade entre os proprietários do bloco, o que conduziu o magistrado a considerar que os proprietários de unidades no bloco pudessem delas usufruir, sem pagamento, sendo tal interpretação jurídica, porque, sem haver dono, a convenção poderia dispor o uso de duas vagas por três apartamentos, exatamente por não estar a vaga de garagem vinculada à quantidade de frações adquiridas.

Registra ainda o desembargador Ênio Santarelli Zuliani que o autor não está em conflito com os outros moradores e que resistem ao direito que lhe foi previsto na convenção. Controverte, sim, com a administração (síndico), porque está pretendendo cobrar um aluguel para que ele, autor, use da garagem de seu bloco.

Por tudo isso, entendeu o relator que o direito deve priorizar a situação do proprietário, que ele tem um direito real reconhecido pelo sistema registral (registro de convenção) e que o disposto no regulamento por falta de registro imobiliário (foi inscrito no cartório de títulos e documentos) não integra o objeto do imóvel, de modo que não poderia a disciplina do regulamento contrariar o que foi definido pela convenção.

Votaram com o relator os desembargadores Flávio Pinheiro e Waldemar Nogueira Filho. A íntegra da decisão pode ser consultada no sítio do TJSP ou na RT 812/21.

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